Eu sempre acho que amanhã será o dia de mudar de vez,
de me assumir por completo. Mas daí o amanhã chega e tenho uma imensa preguiça
de sair da minha área de conforto, porque é bem provável que ninguém entenda. E
dá medo encarar o que é definitivo. E porque é mais fácil reclamar da vida do
que torná-la leve de sobreviver. Hoje eu sinto saudade e nem sei do quê. É uma
angústia louca, um misto de vontade de chorar e sorriso leve. Eu não sei citar
motivos, mas alguma coisa me falta. Estou ao mesmo tempo feliz e deprimida,
tenho companhia e nunca fui tão sozinha, tenho sucesso e nunca me senti tão
fracassada. Eu crio mil planos pra mim e boicoto todos eles. A vida é tão cheia
de ciclos e fases e eu me agarro doentiamente ao conhecido. Eu evito mudanças
drásticas, sabendo que são meus impulsos mais interessantes e busco o conforto
da mesmisse. É ridículo, não há surpresas. Ninguém nunca espera que eu saia dos
meus limites. Quem me conhece de verdade? E quem sabe dos momentos que eu estou
a ponto de explodir? As saudades são grandes, o telefone mudo. Me identifico
com livros e personagens e nem tenho uma história pra contar. E se eu contar,
quem vai se importar? Eu me importo, e muito. Quero marcar mais quem passa por
mim, quero perder esse medo de não agradar, essa preocupação em ser o que todos
esperam. Tentando não incomodar ninguém eu fico neutra. Invisível. E todas as
minhas experiências de falta de preocupação já me indicaram que seria bem
melhor me assumir. Eu não sou tímida. Sou calculista.